Ciclismo e jejum intermitente: a combinação certa para melhorar o VO2 Máximo?

O ciclismo é um dos esportes mais eficientes para melhorar a capacidade cardiovascular e o condicionamento físico geral. 

Com o aumento da popularidade do jejum intermitente, muitos ciclistas têm explorado a combinação dessas duas práticas como uma estratégia para otimizar a performance, especialmente com foco no aumento do VO2 máximo, um dos principais indicadores de capacidade aeróbica. Mas será que essa combinação é realmente eficaz para melhorar o desempenho em ciclistas? Vamos explorar detalhadamente como o jejum intermitente afeta o metabolismo, a performance no ciclismo e, em particular, o VO2 máximo.

1. O Que é o VO2 Máximo e Sua Importância no Ciclismo

O VO2 máximo representa o volume máximo de oxigênio que o corpo consegue consumir durante o exercício intenso. Medido em mililitros de oxigênio por quilo de peso corporal por minuto (ml/kg/min), ele é um dos principais indicadores de aptidão aeróbica. No ciclismo, o VO2 máximo é crucial, pois quanto maior for a capacidade do ciclista de consumir e utilizar oxigênio, mais eficiente ele será em manter altas intensidades de esforço por longos períodos.

Fatores Que Influenciam o VO2 Máximo:

  • Genética: O VO2 máximo é parcialmente determinado pela genética, com algumas pessoas nascendo com maior potencial aeróbico.
  • Treinamento: Programas de treino voltados para o aumento da resistência cardiovascular, como treinos intervalados de alta intensidade (HIIT), são eficazes para melhorar o VO2 máximo.
  • Idade e Sexo: Homens geralmente têm VO2 máximo mais elevado devido à maior massa muscular e capacidade de transporte de oxigênio, enquanto o VO2 máximo tende a diminuir com a idade.
  • Composição Corporal: Um percentual de gordura mais baixo favorece o VO2 máximo, pois o corpo utiliza melhor o oxigênio para alimentar os músculos ativos durante o exercício.

2. O Jejum Intermitente: O Que é e Como Funciona?

Jejum Intermitente
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O jejum intermitente (JI) é um padrão alimentar que alterna períodos de alimentação com períodos de jejum. Existem diferentes métodos de jejum intermitente, sendo os mais comuns:

  • 16:8: Jejum de 16 horas e uma janela alimentar de 8 horas.
  • 5:2: Alimentação regular por cinco dias na semana e restrição calórica severa (500-600 calorias) em dois dias.
  • 24 horas: Jejum de 24 horas, uma ou duas vezes por semana.

Efeitos Metabólicos do Jejum Intermitente:

Melhora da Sensibilidade à Insulina: Durante o jejum, os níveis de insulina caem, facilitando a queima de gordura. Isso pode ser benéfico para ciclistas, pois uma maior disponibilidade de ácidos graxos como fonte de energia poupa o glicogênio muscular.

Aumento na Lipólise: O jejum estimula a mobilização de ácidos graxos do tecido adiposo, levando o corpo a usar mais gordura como combustível, especialmente em exercícios aeróbicos de longa duração, como o ciclismo.

Produção de Corpos Cetônicos: Após períodos prolongados de jejum, o corpo entra em cetose, usando corpos cetônicos (derivados da gordura) como fonte de energia. Embora isso seja eficiente em exercícios de baixa intensidade, seu impacto em exercícios de alta intensidade é uma questão controversa.

3. Ciclismo e Jejum Intermitente: Como Essas Práticas Se Relacionam?

A combinação de jejum intermitente e ciclismo tem se tornado uma estratégia atraente para ciclistas que buscam melhorar a composição corporal, aumentar a eficiência metabólica e, potencialmente, o VO2 máximo. A lógica por trás dessa combinação baseia-se em três pilares principais:

3.1. Adaptações Metabólicas

O jejum intermitente aumenta a capacidade do corpo de oxidar gordura durante o exercício. Em treinos de baixa e moderada intensidade, isso pode ser benéfico para a resistência, pois preserva o glicogênio muscular para esforços mais intensos. Esse tipo de adaptação é conhecido como "treinar em estado de baixa disponibilidade de carboidratos" e visa melhorar a eficiência metabólica do ciclista.

No entanto, é importante destacar que, para esforços de alta intensidade, como sprints ou subidas íngremes, o corpo depende fortemente de carboidratos como combustível. A falta de reservas adequadas de glicogênio pode prejudicar o desempenho nesses momentos críticos.

3.2. Potencial Impacto no VO2 Máximo

O VO2 máximo está diretamente relacionado à capacidade de o corpo utilizar oxigênio de forma eficiente. O jejum intermitente pode melhorar a eficiência metabólica e a composição corporal, o que indiretamente pode influenciar o VO2 máximo. Ciclistas com menor percentual de gordura corporal, por exemplo, podem ter um VO2 máximo mais alto simplesmente porque têm menos massa inativa para carregar, tornando o consumo de oxigênio mais eficiente.

No entanto, estudos que examinam diretamente o impacto do jejum intermitente no VO2 máximo são limitados. A maioria das pesquisas foca em outras métricas de desempenho, como a economia de energia ou a potência no ciclismo.

3.3. Respostas Hormonais e Adaptação ao Estresse

O jejum intermitente também afeta os níveis hormonais, principalmente aumentando a produção de hormônio do crescimento (GH) e noradrenalina, ambos associados à queima de gordura e à preservação da massa muscular. Esses hormônios também podem ter um efeito positivo na recuperação muscular e na performance, especialmente em atividades de endurance como o ciclismo.

Por outro lado, o jejum prolongado pode aumentar os níveis de cortisol, o hormônio do estresse, que em excesso pode levar à perda de massa muscular, diminuição do desempenho e aumento do risco de overtraining.

4. Evidências Científicas: O Que Dizem os Estudos?

Diversos estudos foram conduzidos para avaliar os efeitos do jejum intermitente no desempenho esportivo e nas adaptações fisiológicas. Aqui estão alguns dos achados mais relevantes:

4.1. Jejum Intermitente e Capacidade Aeróbica

Estudos têm mostrado que o jejum intermitente pode melhorar a capacidade de utilizar gordura como fonte de energia durante exercícios de longa duração, o que é benéfico para a resistência aeróbica. No entanto, em exercícios de alta intensidade, que dependem principalmente de glicogênio muscular, o jejum pode prejudicar o desempenho, uma vez que as reservas de glicogênio são reduzidas durante o jejum.

Um estudo publicado no Journal of the International Society of Sports Nutrition observou que atletas de endurance que praticavam jejum intermitente apresentaram melhoras na composição corporal e na eficiência metabólica, mas não houve evidências claras de que o VO2 máximo tenha sido diretamente afetado pelo jejum.

4.2. Jejum e Performance em Ciclismo

Outro estudo realizado em ciclistas amadores indicou que o jejum intermitente pode ajudar na perda de peso e na redução do percentual de gordura, sem prejudicar a performance em treinos de baixa e moderada intensidade. No entanto, durante sessões de alta intensidade, os ciclistas relataram maior percepção de fadiga e menor potência de saída.

Isso sugere que, enquanto o jejum intermitente pode ser benéfico para ciclistas que buscam melhorar a resistência aeróbica e a composição corporal, pode haver uma compensação em termos de desempenho em esforços de alta intensidade.

5. Estratégias de Combinação: Como Otimizar o Jejum Intermitente e o Ciclismo

Se a combinação de ciclismo e jejum intermitente parece interessante, é importante adotar uma abordagem estruturada para maximizar os benefícios e minimizar os riscos. Aqui estão algumas estratégias:

5.1. Sincronize Seu Jejum com o Treinamento

Para treinos de baixa intensidade, como longas pedaladas em ritmo constante (zonas de frequência cardíaca mais baixas), o jejum pode ser uma estratégia eficaz. No entanto, para treinos de alta intensidade ou provas, é recomendável alimentar-se adequadamente com carboidratos para garantir que as reservas de glicogênio estejam cheias.

5.2. Priorize a Recuperação

A janela pós-treino é crítica para a recuperação, especialmente quando se treina em jejum. Certifique-se de ingerir uma refeição rica em proteínas e carboidratos de alta qualidade logo após o treino, para otimizar a recuperação muscular e restaurar as reservas de glicogênio.

5.3. Evite Overtraining

O jejum intermitente pode aumentar os níveis de cortisol, o que, combinado com treinos intensos, pode levar ao overtraining. Monitore sinais de fadiga, distúrbios no sono e queda de desempenho, ajustando o volume de treino e o protocolo de jejum conforme necessário.

A combinação de ciclismo e jejum intermitente pode ser uma estratégia interessante para ciclistas que buscam melhorar a composição corporal, aumentar a resistência e potencialmente influenciar o VO2 máximo. No entanto, os benefícios do jejum intermitente no desempenho de alta intensidade e na melhora direta do VO2 máximo ainda são incertos e podem variar de indivíduo para indivíduo.

Para aqueles que desejam experimentar essa abordagem, a chave está em equilibrar o jejum com um plano de treinamento bem estruturado, garantindo que as necessidades nutricionais sejam atendidas, especialmente para sessões de treino mais intensas. O acompanhamento de um profissional de saúde ou de um treinador esportivo é essencial para garantir que essa combinação seja segura e eficaz a longo prazo.