Monitorar a glicose no sangue está em alta, contudo três especialistas esclarecem que o entusiasmo em torno dessa tendência é antecipado.
Metabolismo acelerado. Mais energia. Desempenho aprimorado. Essa é a promessa dos influenciadores que incentivam atletas a usarem monitores contínuos de glicose (CGMs) – pequenos dispositivos circulares, fixados na parte superior dos braços, que fornecem dados constantes sobre os níveis de açúcar no sangue (ou glicose). Contudo, quão relevante é para um ciclista comum manter o equilíbrio desses níveis?
Originalmente desenvolvidos para auxiliar no controle da desregulação da glicose, como no diabetes 1 e 2, esses dispositivos estão sendo cada vez mais usados por atletas que monitoram seus níveis de glicose para melhorar energia, alimentação e exercícios.
A FDA, órgão americano, parece concordar que conhecer os níveis de glicose pode ajudar até mesmo quem não tem diabetes, pois aprovou a comercialização de um CGM de venda livre, que pode ser adquirido sem receita médica.
Para compreender esses dispositivos e o equilíbrio dos níveis de glicose, três especialistas explicam a importância de conhecer sua taxa de açúcar no sangue, os prós e contras dos CGMs e oferecem dicas práticas para estabilizar seus níveis de glicose sem usar um aparelho.
Você Realmente Precisa Equilibrar Seus Níveis de Glicose?
Comparado a pessoas com diabetes, indivíduos sem a condição geralmente apresentam variações de glicose mais controladas.
Contudo, diversos fatores, como escolhas alimentares equilibradas e níveis adequados de atividade física, podem ainda provocar picos e quedas abruptas, ocasionando sintomas incômodos – como confusão mental, cansaço extremo e quedas bruscas de energia – segundo Selvi Rajagopal, M.D., professora assistente de medicina na Escola de Medicina da Universidade Johns Hopkins.
Para pessoas com diabetes, grandes oscilações na glicose podem desencadear uma série de repercussões físicas que resultam em doenças e internações.
Quem tem diabetes precisa aprender a organizar sua alimentação e atividades para manter seus níveis de glicose dentro de uma faixa específica. Além disso, utilizam medicação com insulina, pois o diabetes é uma condição em que o organismo não produz insulina suficiente ou não a utiliza adequadamente, segundo o Centers for Disease Control.
Quando isso ocorre, o excesso de açúcar permanece na corrente sanguínea, podendo ocasionar doenças cardíacas e outras enfermidades graves.
Monitores Contínuos de Glicose ( CGM)
Os CGMs foram desenvolvidos para monitorar os níveis de glicose no sangue ao longo do dia para pessoas com diabetes, relata Alex Larson, RDN, nutricionista registrada em Minnesota especializada em atletas de resistência.
Anteriormente, pessoas com diabetes precisavam furar o dedo ou outra parte do corpo e usar uma tira para medir a glicose naquela gota de sangue. Em seguida, inseriam a tira em um leitor que indicava se o nível de açúcar estava baixo, adequado ou elevado, de forma simples e eficiente.
Os CGMs funcionam de forma distinta. São discos com sensor de agulha fina descartável que fica sob a pele. Esse sensor mede os níveis de açúcar a cada poucos minutos e transfere a leitura para um aplicativo ou medidor que registra os resultados. É preciso trocar o sensor a cada poucos dias para mantê-lo limpo.
Para quem tem diabetes, um CGM pode transformar a vida, pois permite monitorar os níveis de açúcar sem interromper as atividades para realizar testes. Isso é especialmente vital para crianças com diabetes juvenil, já que pais e enfermeiros escolares podem acompanhá-las sem estarem fisicamente presentes.
Hoje, atletas de resistência, como ciclistas, utilizam CGMs para avaliar como o corpo reage ao combustível ingerido durante os treinos, explica Larson. “Há alegações de que o uso de um CGM pode aumentar o metabolismo e realmente otimizar a nutrição através da estabilidade glicêmica”, afirma ela.
Vantagens do Uso de um CGM
Para ciclistas curiosos sobre os níveis de açúcar, existem benefícios reais ao utilizar um CGM.
“As vantagens de usar um CGM são que os atletas aprendem na prática como o corpo responde aos seus treinos e à alimentação”, diz Larson.
Quando combinados com outros dados – incluindo métricas objetivas como frequência cardíaca e potência, além de medidas subjetivas como percepção de esforço e sensação geral do atleta – os dados do CGM podem revelar problemas relacionados à alimentação e desempenho, explica Nicole Rubenstein, MS, RD, CSSD, nutricionista registrada e proprietária da Racer’s Edge Nutrition, no Colorado.
Por exemplo, se após quatro horas de um percurso a potência de um atleta começar a cair muito abaixo da meta, é possível analisar os dados de glicose para verificar se valores baixos realmente contribuem para a queda de ritmo.
Rajagopal acrescenta que há um benefício potencial para quem percebe sinais de baixa glicose, como suor frio, confusão mental, fadiga, tontura, nervosismo, aumento da frequência cardíaca e desempenho reduzido durante o exercício. “Acredito que, nessa situação, pode ser bastante esclarecedor”, afirma ela.
Contras do Uso de um CGM
A ressalva é que, devido à enorme quantidade de dados gerados pelos CGMs, não existem diretrizes estabelecidas para interpretá-los (a não ser que você tenha um distúrbio na regulação da glicose, como o diabetes). Por isso, os especialistas recomendam consultar um nutricionista, médico de atenção primária ou endocrinologista para orientar a interpretação e as decisões baseadas nas informações do CGM.
Além disso, não há pesquisas atuais que comprovem que o uso de um CGM aumente o desempenho, afirma Larson. Tampouco há evidências suficientes de que possam auxiliar no diagnóstico de excesso ou falta de combustível. Para piorar, esses dispositivos são caros: o custo médio de um kit inicial é de US$ 1.000 por ano, e alguns CGMs podem custar vários milhares anualmente.
Ademais, confiar demais nos CGMs pode desencadear ansiedade e uma mentalidade prejudicial em relação à alimentação. Rubenstein afirma que os dispositivos podem aumentar o risco de transtornos alimentares. “Já vi pacientes com oscilações de glicose insignificantes e, por isso, passam a restringir a ingestão de carboidratos”, diz ela.
Isso é particularmente preocupante em um esporte como o ciclismo, onde os transtornos alimentares já são comuns. Um estudo de 2022 com cerca de 400 ciclistas femininas de elite constatou:
- 13% das participantes haviam sido tratadas por um transtorno alimentar;
- 28% provavelmente apresentavam o transtorno;
- 32% provavelmente se beneficiariam de avaliação clínica.
A ausência de diretrizes sobre como agir com os dados também pode levar as pessoas a tomarem decisões mal informadas e equivocadas.
“É muito fácil analisar em excesso os dados do CGM e chegar a conclusões erradas”, diz Rubenstein. “Por exemplo, se comer uma maçã faz o açúcar subir a 140 e o sorvete apenas a 120, isso não significa que o sorvete seja uma escolha mais saudável do que uma maçã.”
Outro exemplo: Se alguém em risco de diabetes percebe que seu açúcar no sangue tende a cair rapidamente após consumir um gel, pode achar que a solução é simplesmente ingerir mais géis para compensar essa queda.
Contudo, pode ser vantajoso substituir o gel por um carboidrato mais complexo e combiná-lo com proteína ou gordura. “Não existe uma solução única para pessoas com baixa glicose”, diz Rajagoal. “Preocupo-me um pouco com a possibilidade de seu método de controle mudar de forma equivocada com base nas informações.”
A verdade é que fatores assim não devem ser interpretados de forma simples.
Para interpretar completamente os dados do CGM, seria necessário acompanhar e analisar uma enorme quantidade de outras informações. “A pessoa comum provavelmente não vai dedicar duas horas diárias para analisar todos esses dados”, diz Rubenstein, acrescentando que não recomenda essa abordagem, mesmo que haja interesse.
Então, Você Deve Adquirir um CGM?
Todos os três especialistas concordam que investir em um CGM não vale a pena para o ciclista médio — a menos, é claro, que seu médico o tenha recomendado. “A literatura atual não sustenta tais alegações e prefiro que ciclistas e atletas de resistência concentrem seu tempo, energia e dinheiro em desenvolver estratégias básicas de alimentação tanto nos treinos quanto fora deles”, diz Larson.
Pessoas com histórico de transtornos alimentares ou com comportamentos alimentares desordenados, devem evitá-los, acrescenta Rubenstein. O mesmo pode valer para quem sofre de transtornos de ansiedade, já que o acesso a dados de glicose “pode aumentar a ansiedade”, observa ela.
Se você ainda quiser experimentar um, Larson sugere trabalhar com um nutricionista que possa ajudar a decifrar os dados e oferecer contexto sobre os números, sua alimentação e um plano de treino.
Como Equilibrar o Nível de Glicose Sem um CGM?
A verdade é que você não precisa de um CGM para tomar decisões inteligentes sobre seus níveis de glicose no sangue. Larson recomenda se informar sobre diretrizes de alimentação para esportes de resistência (onde um nutricionista pode ser útil) e testar diferentes combustíveis para descobrir o que melhor o sustenta durante os trajetos.
O conselho de Rubenstein: Consuma uma dieta equilibrada, baseada em alimentos integrais, com quantidades suficientes de proteínas e carboidratos que correspondam à intensidade e volume do seu treino.
Além disso, lembre-se de que toda a comoção em torno dos CGMs pode fazer com que muitos acreditem que os carboidratos são inimigos — o que não é verdade! “Nosso corpo precisa de carboidratos para gerar energia”, diz Larson.
Ao se exercitar, o corpo libera pouca insulina após consumir carboidratos e açúcares, pois o açúcar é levado diretamente aos músculos sem auxílio insulínico. Ademais, o exercício aumenta a sensibilidade à insulina, acrescenta ela. Os músculos utilizam a insulina disponível com maior eficiência durante e após a atividade.
Por fim, e talvez mais importante, saiba que “as oscilações do açúcar no sangue são normais”, afirma Rubenstein. Ao analisar os dados do CGM, o objetivo não é obter uma linha plana, mas sim que as variações de glicose sejam mais graduais e não abruptas – resultado, em parte, de refeições equilibradas que combinem carboidratos, proteínas e gorduras saudáveis.
Conclusão Final Sobre o Equilíbrio da Glicose
Uma boa notícia para os entusiastas dos CGMs: Rajagopal acredita que chegaremos a um ponto em que haverá orientações mais específicas sobre o uso dos CGMs para pessoas sem diabetes, permitindo seu uso autônomo sem a necessidade de acompanhamento médico. “Acredito que há muito potencial”, diz ela. “Só acho que ainda não atingimos esse estágio.”
Enquanto isso, ela aconselha concentrar-se nos princípios fundamentais da alimentação saudável e incentiva os ciclistas a investirem seu dinheiro em uma consulta com um nutricionista, que pode auxiliá-los a ajustar um plano alimentar. “No final das contas, tudo se resume ao básico: como você se alimenta?”, diz Rajagopal.
Perguntas Frequentes - FAQ
Para quem tem diabetes é bom andar de bicicleta?
Andar de bicicleta é um exercício aeróbico benéfico para pessoas com diabetes, pois melhora a sensibilidade à insulina, auxilia no controle do peso e promove a saúde cardiovascular. É fundamental que a prática seja realizada com segurança e após avaliação médica.
Quais exercícios para baixar a glicose?
Os exercícios ajudam a reduzir os níveis de glicose no sangue. Recomenda-se a prática de:
- Exercícios aeróbicos: caminhada, corrida, ciclismo e natação, que aumentam a captação de açúcar pelos músculos.
- Exercícios de resistência: musculação, que melhora a sensibilidade à insulina.
A combinação orientada desses exercícios pode oferecer melhores resultados no controle glicêmico.
Como normalizar a glicose rapidamente?
A normalização rápida dos níveis de glicose deve ser realizada com cautela e sempre sob supervisão médica. Em casos de hiperglicemia, pode ser necessário ajustar a medicação (como a insulina), melhorar a hidratação e adotar uma alimentação equilibrada. Medidas sem orientação profissional podem ser perigosas.
Como estimular o pâncreas para produzir insulina?
Não existem métodos comprovados para estimular diretamente o pâncreas a produzir mais insulina. A estratégia foca em preservar a função das células beta por meio de:
- Controle rigoroso dos níveis de glicose
- Alimentação saudável
- Prática regular de exercícios
- Uso adequado de medicações conforme orientação médica
Qual nível de glicose é preocupante?
Os níveis de glicose que podem ser preocupantes variam de acordo com o contexto:
- Jejum normal: 70 a 99 mg/dL (em adultos sem diabetes).
- Pré-diabetes: 100 a 125 mg/dL em jejum.
- Diabetes: 126 mg/dL ou mais em jejum.
- Pós-prandial: Níveis persistentemente acima de 180 mg/dL.
- Hipoglicemia: Menos de 70 mg/dL, que requer atenção imediata.
Quem tem diabetes pode pedalar bicicleta?
Sim, pessoas com diabetes podem pedalar bicicleta. Esse exercício beneficia o controle glicêmico e a saúde cardiovascular, mas é essencial monitorar os níveis de glicose antes, durante e após a atividade, seguindo as orientações médicas.
Qual é o limite ideal da glicose?
Os valores ideais de glicose variam conforme o perfil individual. Para pessoas sem diabetes, a glicemia de jejum deve ficar entre 70 e 99 mg/dL, e os níveis pós-prandiais abaixo de 140 mg/dL. Para diabéticos, as metas comuns são manter a glicemia de jejum abaixo de 130 mg/dL e os níveis pós-prandiais abaixo de 180 mg/dL, conforme orientação médica.
Qual nível de glicose é fatal?
Não há um valor único que seja considerado fatal, pois isso depende de diversos fatores. Níveis extremamente altos, por exemplo, acima de 600 mg/dL, podem levar a complicações graves, como a síndrome hiperglicêmica hiperosmolar. Por outro lado, hipoglicemias severas (geralmente abaixo de 40 mg/dL) também são perigosas e requerem intervenção imediata.
Quando a glicose está 300, o que fazer?
Um valor de 300 mg/dL é elevado e requer atenção imediata. Recomenda-se:
- Confirmar o resultado com uma nova medição.
- Verificar a presença de cetonas, principalmente em casos de diabetes tipo 1.
- Seguir as orientações do médico, que podem incluir ajustes na medicação ou na insulina.
- Manter uma boa hidratação e, se possível, realizar exercícios leves, desde que não haja contraindicações.
Se houver sintomas de cetoacidose (náusea, vômito, dor abdominal ou respiração acelerada), procure atendimento médico imediatamente.
Como manter a glicose em 80%?
Manter a glicose na faixa alvo por 80% do tempo (Time in Range) exige um gerenciamento abrangente do diabetes. As estratégias incluem:
- Monitoramento contínuo da glicemia para identificar padrões.
- Adaptação da dieta com alimentos de baixo índice glicêmico.
- Prática regular de exercícios físicos.
- Ajuste da medicação conforme orientação médica.
Qual o horário em que a glicose fica mais alta?
Os níveis de glicose tendem a aumentar no período pós-prandial, geralmente entre 1 a 2 horas após as refeições. Além disso, o fenômeno do alvorecer pode elevar os níveis nas primeiras horas da manhã devido à liberação de hormônios que estimulam a produção de glicose pelo fígado.
Qual é a fruta que faz baixar a glicose?
Não há uma fruta que, isoladamente, reduza ativamente os níveis de glicose. Entretanto, frutas com baixo índice glicêmico – como maçã, pera, morangos e mirtilos – podem ser incluídas em uma dieta balanceada para ajudar no controle glicêmico, promovendo uma elevação mais moderada dos níveis de açúcar.
Qual a glicemia normal ao acordar?
Em adultos sem diabetes, a glicemia em jejum (ao acordar) geralmente varia entre 70 e 99 mg/dL. Para pessoas com diabetes, as metas podem ser ajustadas, mas recomenda-se frequentemente manter esse valor abaixo de 130 mg/dL, conforme orientação médica.
Dormir muito aumenta a glicose no sangue?
A relação entre a duração do sono e os níveis de glicose é complexa. Tanto a privação quanto o excesso de sono podem afetar negativamente o metabolismo e a sensibilidade à insulina, por isso é essencial manter um padrão de sono de qualidade e regular.
Como é o suor do diabético?
Não existe uma característica específica que diferencie o suor de uma pessoa com diabetes daquele de indivíduos sem a doença. Em alguns casos, complicações como a neuropatia autonômica podem alterar a regulação da sudorese, mas não há um padrão clinicamente reconhecido para o “suor do diabético”.
O que comer à noite para não aumentar a glicemia?
Para evitar picos de glicemia à noite, é recomendada uma refeição leve e balanceada, composta por:
- Alimentos com baixo índice glicêmico (vegetais e grãos integrais).
- Proteínas magras (como frango, peixe ou tofu).
- Gorduras saudáveis em quantidades moderadas.
Evite carboidratos simples e açúcares em excesso. O controle das porções e a qualidade dos alimentos são essenciais para manter os níveis de glicose estáveis durante a noite.