Sim, o tricampeão do Tour de France, pesando apenas 67 kg, pode superar Van der Poel nos traiçoeiros paralelepípedos de Roubaix.
Mas, para isso, precisará de pernas poderosas, sorte extraordinária e uma benção dos deuses do clima.
Tadej Pogačar é capaz de quase tudo. Mas será que esse verdadeiro super-herói do ciclismo conseguirá triunfar em Paris-Roubaix, fazendo sua estreia triunfal em um dos clássicos mais temidos do calendário, já no próximo mês? A resposta é sim. Contudo, com algumas ressalvas.
Uma Combinação Quixotesca
O tricampeão do Tour de France precisa de uma mistura quase mágica de boa sorte, tempo favorável e uma raiva quase visceral por ter perdido a oportunidade em Milan-San Remo para conseguir, assim, superar os grandes nomes do pelotão e levantar um troféu feito de paralelepípedos em 13 de abril.
Se ele conseguir essa façanha, estará escrevendo seu nome como o primeiro vencedor do Tour a conquistar o "Inferno do Norte" desde os tempos de Bernard Hinault, garantindo também um lugar de destaque no "Hall da Fama" do ciclismo.
Um Escalador Leve com Credenciais nos Pavés

A equipe UAE Emirates-XRG anunciou recentemente que o campeão mundial de 67 kg se juntará, no próximo mês, a uma fileira de gigantes que dominam os pavés em “A Rainha dos Clássicos”. Nomes como Wout van Aert, Filippo Ganna, Mads Pedersen e o tricampeão Mathieu van der Poel certamente ficaram indignados ao saber da notícia.
Mas por que tanta confiança? Primeiramente, porque se trata de Tadej Pogačar – Pogi faz o que faz de melhor. Além disso, o ex-vencedor da Tour de Flanders já provou que sabe lidar com os paralelepípedos. Em 2022, ele despachou a quinta etapa do Tour de France com maestria, enfrentando 11 setores de Roubaix como se fosse um especialista no assunto.
Mais recentemente, um vídeo seu, onde parecia deslizar pelo infame Trouée d’Arenberg, viralizou no Instagram, demonstrando que, mesmo entre os grandes, ele é capaz de surpreender.
Embora o estilo de Tadej Pogačar sobre os pavés não seja o mesmo dos tradicionais reis dos clássicos – que se apoiam num esforço mecânico de alta potência e cadência baixa, como Tom Boonen – o ciclista leve utiliza sua fisiologia singular e habilidades excepcionais para compensar a fragilidade de seus músculos esguios.
Além disso, os pavés brutais do Carrefour de l’Arbre, Mons-en-Pévèle e Arenberg impõem um desafio de alto nível quando comparados a trechos de cascalho italiano, e o jovem de 26 anos já demonstrou, com sua sequência histórica nas Strade Bianche, que é um dos melhores na arte de manejar a bicicleta.
Curiosamente, o incidente de Tadej Pogačar na Toscana, no início deste mês, ocorreu no asfalto – um dos raros momentos de contato intenso com o pavimento – quando um buraco e um estouro de pneu fizeram com que ele caísse na Liège-Bastogne-Liège de 2023.
Conquistando o Inferno
No confronto com Van der Poel, Tadej Pogačar chega com cerca de 10 kg a menos e mais de 50 watts a menos de potência. Se Paris-Roubaix fosse apenas uma questão de força bruta, ele seria rapidamente dominado pelos traçados severos dos campos agrícolas de Roubaix. Diferente das subidas íngremes com pavés da Ronde, a gravidade não estará a seu favor nesta prova.
Hoje, Paris-Roubaix deixou de ser uma simples competição de músculos. As evoluções na tecnologia das bicicletas – desde o dimensionamento dos pneus e rodas até suspensões modernas – impediram que escaladores esguios pulassem sobre os paralelepípedos com a leveza de um brincalhão.
Preparar-se para Roubaix não se resume mais a uma simples volta de fita de manípulo e uma prece; hoje, habilidades técnicas, inteligência tática e uma autoconfiança quase ousada são fundamentais nesse caldeirão caótico conhecido como "Inferno do Norte".
Rezando por Bom Tempo e Uma Dose Extra de Sorte
Tudo precisará se alinhar perfeitamente para que Tadej Pogačar conquiste seu quarto título em monumento no próximo mês, na arena dos pavés de Roubaix. Uma performance impecável no Tour das Flandres e uma recuperação exemplar serão cruciais.
Uma semana depois, um percurso seco e um vento favorável em direção a Roubaix poderão pender a balança a seu favor. Tadej Pogačar e a equipe UAE Emirates-XRG estarão elevando suas preces aos deuses do tempo, torcendo para que não haja chuvas torrenciais – como as que transformaram Roubaix de 2021 em um verdadeiro inferno enlameado.
Ventos contrários e um percurso pesado podem jogar as probabilidades contra o escalador que, mesmo vestindo cores chamativas, depende fortemente do fator sorte. Além disso, a equipe precisará contar com toda a força dos superdomestiques – como Nils Politt e Florian Vermeersch – para empurrar o líder estreante rumo às melhores linhas entre os pavés.
A experiência desses corredores, que já conquistaram posições de destaque no "Inferno do Norte", será fundamental para preencher eventuais lacunas deixadas após a última exibição de Tadej Pogačar.
Tadej Pogacar will be the first reigning Tour de France champion since Greg Lemond in 1991 to race Paris-Roubaix 🧱💛 pic.twitter.com/IiSuZIrsLX
— Cycling on TNT Sports (@cyclingontnt) March 26, 2025
Mesmo num pelotão moderno, onde cada detalhe é otimizado, a sorte continua a ser um fator decisivo em Roubaix. Foi exatamente isso que Wout van Aert descobriu de forma dolorosa, ao ver suas chances evaporarem devido a um furo no pneu, no coração do "Inferno" em 2023.
Nos últimos meses, alguns sinais de vulnerabilidade surgiram na aura de invencibilidade de Tadej Pogačar. Uma queda nas Strade Bianche e uma tentativa fracassada em San Remo mostraram que, por vezes, o Pogi pode não ser tão intocável quanto parece. Mas, quem sabe, ele já tenha superado essa fase de azar.
Caso isso aconteça, Tadej Pogačar poderá levantar a taça de Paris-Roubaix nesta primavera. E, se não for dessa vez, com toda certeza ele voltará com força total em 2026.
Enquanto isso, só nos resta preparar a pipoca e esperar pelo espetáculo.